Provinda do mesmo vetor, o Aedes aegypti, a Chikungunya, mais uma arbovirose com sintomas semelhantes à dengue, pode estar passando despercebida.
Um texto científico publicado no periódico The Lancet, no dia 30 de abril, escrito por pesquisadores brasileiros, demonstra uma subnotificação da doença.
No documento há dados do estado de Minas Gerais que vêm a ilustrar a disparidade entre os casos notificados oficialmente e os casos reais estimados.
“Descrevemos uma subnotificação em relação ao número absoluto de casos. Percebemos que, em diversas epidemias, a contagem não tem sido precisa. Isso ocorre, em parte, devido à confusão com a dengue, o que leva a uma investigação inadequada”, comenta André Ribas, um dos autores do texto que ainda afirma que a subnotificação pode estar ocorrendo em outras regiões do Brasil e da América do Sul.
Na última divulgação feita em 14 de maio pelo Ministério da Saúde, ao menos 102 pessoas morreram pelo vírus Chikungunya no Brasil em 2024, com 106 óbitos em investigação.
Com quase os mesmos sintomas que a dengue, a Chikungunya está mais associada à dores intensas e prolongadas nas articulações, que persistem por semanas ou até meses. No entanto, causam hemorragias com menos frequência.
“Essa falta de distinção entre as doenças gera um problema. Não é exclusivo do Brasil; outros países das Américas também enfrentaram desafios semelhantes”, complementa o médico epidemiologista Ribas que também afirma que poucos médicos estão familiarizados com as formas graves de Chikungunya, “isso resulta em uma subestimação também do número de óbitos. Nosso trabalho, publicado na Lancet, focou precisamente nessa questão, e usamos o exemplo de Minas Gerais como ilustração.”.
Segundo o documento, o estado de Minas Gerais adotou o método de PCR triplex, exame que detecta partículas virais com precisão e reduz os falsos positivos, com a vantagem da possibilidade de detecção de múltiplos vírus em um único exame.
Entre os riscos de se tratar a Chikungunya como dengue é justamente o excesso de hidratação, como alerta a médica Dra. Camila Ahrens, “especialmente em casos graves. O tratamento da dengue grave envolve hidratação agressiva, que pode ser prejudicial em casos de Chikungunya que desenvolvem complicações como choque cardiogênico ou encefalite”.
Já o virologista Flávio Fonseca, professor no CTVacinas (Centro de Pesquisas em Biotecnologia) e do Departamento de Microbiologia da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), destaca que a única coisa que eles têm em comum é o fato de que eles são transmitidos pelo Aedes aegypti, e secundariamente pelo Aedes albopictus.
“Em momentos como o atual, é muito difícil diagnosticar Chikungunya porque a doença predominante é a dengue, e quando o teste dá negativo para quadro, não se faz a busca adequada por um segundo patógeno, que pode estar causando os sintomas. Embora a dengue possa ser fatal, especialmente nas formas hemorrágicas e de choque, a mortalidade geral é relativamente baixa se comparada com a da Chikungunya, que pode causar complicações graves como encefalite e choque cardiogênico”, conclui o virologista.